



Conversei com o João. Continuar lá, assim como estava, era condenação à morte. Soube que meus pais estavam doentes. Falei com o patrão que queria voltar. Não perguntaram muita coisa. Só que tive que pedir dinheiro emprestado para ele, para o frete, passagens, devolver a casa em condições. Queriam que eu ficasse mais um mês. Não podia ser. Tinha que ser naquela hora. Para evitar dores maiores. Compromisso que eu trouxe junto: fazer o trabalho de lá, aqui no sul. Sem problemas. Acho que naquela hora eu era capaz de prometer qualquer coisa para qualquer pessoa. O importante era sair de lá.
Dificil foi encontrar alguém que fizesse a mudança e ainda nos trouxesse junto, mais os nosso cães. Pois de ônibus não poderíamos, nem de avião, pq iriam pedir a documentação do João e veriam que ele estava ilegal.
Deus... comecei a contar as horas e os minutos.
"Todo dia ela faz tudo sempre igual..." Levantar-nos cedo. Sair e deixar o João. Transporte coletivo tão cheio de pó, tão sujo... Passar o dia fora. Passar o dia a ser analisada. Voltar e encontrar um João sem sonhos, sem projetos, muito calado. Nos fins-de-semana sem ter onde ir, quer seja pela falta de amigos, quer seja por falta de transporte. Pena. Uma cidade muito limpa, ruas largas, verdes tão encantadoramente verdes mesmo sob sol de mais de 30 graus.
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Olha, todo mundo dizia que os gerentes eram capazes de entrar nos nossos computadores e analisarem o que lá tínhamos, o que estávamos fazendo, por onde andávamos, se estávamos no msn e com quem. Nunca tinha perguntado como, nem visto ou sentido algo diferente. Passei a observar, além das pessoas, isto também. Um dia vi algo estranho. Uma luzinha acendendo bem embaixo, na barra do computador. Perguntei para o "entendido" e me informou que qdo isso acontecia é pq tinha alguém no meu computador. No primeiro dia em que me dei conta, eu ri muito. Achava isto uma besteira sem tamanho. No segundo dia, sem esperar, lá de novo a tal de luz. Deste dia em diante, não tinha hora certa para "estarem" comigo. Uma vez, duas vezes por dia ou mais. Começou a ser uma tortura psicológica. Na história do Pequeno Príncipe, a Raposa ficava feliz pq sabia que a tal hora o menino iria aparecer e só o estar a espera daquela hora já lhe trazia alegria ao coração. Comigo, ao contrário. Não era o Pequeno Príncipe. Não tinha horário determinado. Não me trazia alegria. Era terror. Medo. Pânico.
Mais um motivo para chorar, aumentar aqueles sentimentos já descritos.
Era preciso fazer algo. Era hora de agir.
Geralmente eu penso muito antes de escrever, ou falo as coisas pela metade, para não magoar ninguém ou para não sair magoada.
Vou tentar não me "esparramar" muito entre as letras deste teclado e assim contar o "causo" sem mais delongas! hahaha
Não é de rir não. Foram muitas as lágrimas. Nós não tinhamos amigos. Como o João sairia pela cidade à procura de emprego, sem ajuda, estando ilegal no país? Ele passava o dia inteiro em casa, cuidava da nossa horta. Eu ia só, todos os dias para o trabalho, procurando furos, brechas, culpados.. Alguma atitude eu precisava tomar, por nós dois, mas era preciso analisar, programar, achar a porta! O João, pouco a pouco ia ficando apático, desinteressado, distante.. Também, dá para imaginar uma pessoa trabalhar 30 anos em uma empresa, ser responsável por execução de projetos, conhecer e saber fazer com maestria tudo o que se relacionava com eletricidade, máquinas.. de repente ficar na dúvida: dispensaram-me por medo de estar eu ilegal, ou por ter ameaçado o posto de alguém e esta pessoa ter colocado que não tenho capacidade para exercer a função?
-bolas, tenho que sair - volto mais tarde ------